domingo, maio 15, 2011

Cigarette Countdown - #14

Horas. Eras se passaram por nós duas. A lua se moveu rapidamente, e não está mais onde a vi pela primeira vez: nos seus cabelos. Não há mais música, não há mais vozes de um universo distante, atrás da porta do nosso quarto. Este quarto! 
Tudo diferente. Lençóis devastados, você descoberta, eu desmedida, metida em sua vida numa única noite, numa única lua, em 13 cigarros.
Nada existia antes dessa noite, não houve antes desse momento, não houve antes dos seus cabelos, nunca houve um verdadeiro ANTES de você.
Num esforço tremendo dos meus músculos entregues aos seus, me levanto, estico, imploro pra não esquecer de voltar pra cama, pois já estou perdida nos flashes de um depois de você. 
Não me deixe divagar, eu peço com os olhos iluminados pelo isqueiro, meio escondido pela minha mão trêmula. 
Não me deixe dizer não, eu rogo, sugando o ar poluído desse novo cigarro. 
Não me deixe sair de você, eu exalo minha súplica  no ar.
Você desavisada dos meus pensamentos mais escorregadios, me pergunta: Pra onde irá depois daqui? Pra onde irei? Depois disso? Depois dessa noite? Depois...
E lembro tristemente de um Antes:

Uma casa. Vazia.
Flores num canto esperando vida.
Chave na porta.
Imagem confusa no espelho do elevador.
Eu.
Descendo, sucumbindo na noite.
Rua, beco escuro.
Ando. Espero. Fumo, sem gosto.
Outra casa. Cheia.
Flores em cabelos cheios de vida.
Porta aberta
Imagem confusa na janela da sala.
Eu.
Te vendo, sucumbindo na sua noite.
Lua., quarto escuro.
Ando. Tenho. Fumo, seu gosto.

Não tem pra onde ir depois daqui. Não sem você. Tremo de medo. Tropeço em expectativas vãs e lençóis. Atravesso nossas roupas e barreiras de um "quem sabe". E transformo sua pergunta num novo impulso de ter um agora, um mais presente, sem antes ou depois.
Me sento ao seu lado, e respondo: Depois? Quem sabe? E ganho meu direito de  ouvir seu agudo de novo, numa gargalhada, num gemido, num pedido irrecusável de terminarmos juntas esse novo cigarro.


FIM DO DÉCIMO QUARTO CIGARRO

domingo, maio 01, 2011

Cigarette Countdown - #13

... e continuamos, eu e você, de onde nunca deveríamos ter parado. 

Esqueço a interrupção daquela voz que não era minha, ardendo em seus ouvidos ao telefone. Você agora arde em mim, comigo e pra mim. Mas sei que algo mudou. Você treme mais que eu, você fecha mais os olhos e morde os lábios num medo só seu, onde eu não ouso tocar. 
Mas já aprendi como te tocar. 
Acendo um cigarro meu, pra você. Ponho o fogo nos seus lábios tensos. Você sorri e me saboreia neste presente. Desço pelo seu corpo junto com fumaça: língua, garganta, peito. E você me segura , envolve seu braço sem controle sobre meu pescoço. Mais um pouco, suficientemente perto para ouvir seu coração atormentado. Não quero ouvi-lo, não quero ver quem ou o que você guarda nele. 
Me desvencilho do seu não, e você se desvencilha da minha fumaça. Eu desço, eu danço, eu deixo seu controle pra lá e me vejo absolutamente cercada de você. Mais uma fumaça que entra, e sua perna faz o que seus braços não alcançam mais. Desta vez, seu controle é o meu guia, sua perna me impulsiona pra onde eu deveria ir. 
Minha visão escurece, não preciso dela agora. Olfato e paladar, pra saber que você é real. Tato e audição pra saber que eu sou real. Tenho seu gosto em mim, seu cheiro, seus gritos abafados pedindo mais, seus dedos em meus cabelos não me deixando respirar. Tenho tudo, tudo o que eu nunca conseguiria pedir, tudo o que você nunca conseguiria negar.

Tive você, como talvez nem você pudesse se ter. 


Enfim, você se contorce, torce lençóis e me chama exausta. Me devolve com toda gratidão do mundo o fogo que eu te trouxe: o cigarro quase no fim. Como se eu não estivesse já tomada de todos os seus sabores, me delicio com essa pontinha que por instantes esteve morrendo em sua boca.


FIM DO DÉCIMO TERCEIRO CIGARRO


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