terça-feira, maio 19, 2009

Cigarette Countdown #2


Do outro lado da sala, a porta. Aberta, escancarada pra você entrar. 
Do outro lado da porta, o quarto. Escuro, fechado no mistério de quem irá habitá-lo esta noite. 
E eu, entre a porta e você. 
Eu, aberta, escancarada
Você, escura, fechada no seu mistério. 
Entre nós duas, a luz do isqueiro, seu cigarro e meu também em uma única boca. 
Vem pegar, te chamo. 
A chama dança frenética com minha respiração ofegante. 
Chega mais perto, te chamo. 
Não consigo tirar os olhos de você e não percebo o cigarro se consumindo sem ter sido saboreado. Seus cabelos entre os dedos, seus dedos. E os meus? Onde estão? Gelados, paralisados com a inexistente distância de apenas um cigarro. Um cigarro nos separa, sua boca da minha, seus dedos do meu. Seus dedos, meu Deus... você abraça meus dedos num bote de serpente, arranca o cigarro dentre eles, leva até a sua boca, prova-o, liquida-o, liquida a minha esperança de tragar a última dose do veneno. Demora com a fumaça dentro de você, como se eu estivesse lá, dançando na sua língua. E finalmente solta a fumaça e com a voz rouca de quem não tem mais energia de tanto brincar, me pergunta: Quanto vale um cigarro?  





FIM DO SEGUNDO CIGARRO 

sexta-feira, maio 08, 2009

Cigarette Countdown - #1


Sentei-me à distância. 

Acendi o cigarro com uma mão e a outra segurava a sua taça de vinho. Fixei o olhar incrédulo nas suas costas, as curvas do pescoço, as omoplatas, as vértebras alinhadas, equilibradas, dançando pra mim. A luz azul da noite lá de fora privilegiava seus cabelos escuros, amarrados confusamente, numa espiral displicente, descendente.

E então você virou pra mim, sorriu meio sem jeito, e lançou o primeiro passo na minha direção. Caminhou lentamente buscando meu olhar entre a névoa que me envolvia. Mas eu te via perfeitamente. Perfeitamente clara e escura na penumbra da sala. 

Estendeu o braço pedindo o copo. Sua sombra me atingiu primeiro. Meus pêlos despertos sentiram o toque. Mas você ainda estava fora do alcance real. 

E sem imaginar o tremor que isso ia causar dentro de mim, parou no meio do caminho, afastou dos olhos uns tantos fios de cabelo desarrumados e sorriu desleixada, como que dizendo que não daria mais nem um passo. Foi o meu limite! 

 

Fim do primeiro cigarro.

segunda-feira, maio 04, 2009

Reflexo #2 - CORAÇÃO - PEDRA LISA (Setembro 2005)

São raras a vezes que saio de casa e me viro pra olhar pra tras. Mas hoje eu olhei e vi. 

Vi o que não tem nome, o que não tem foto nem palavras pra descrever. Vi o que de fato me consome, o que some e o que me escapa. 

Vi quão perigoso é o chão que piso... e pé ante pé me equilibro nessa massa inconsistente.
 
São raras as vezes que dobro a esquina e sinto um calafrio. Mas hoje eu senti e pensei. 

Pensei que poderia ser a última, a mais importante e a mais sem sentido algum. Senti o que de fato me mata, o que me castra e me atira aos tubarões. 

Senti quão duro é o coração que piso ... e pé ante pé me desequilibro nessa pedra lisa.
 
São raras as vezes que acordo e não respiro. Mas hoje eu acordei e não ... 

Reflexo #1 - PALAVRAS DURAS (Setembro 2005)

Estava saudosista hoje e revirei minhas gavetas. Aqui estão algumas postagens de blogs antigos... mundo distante, mas que ainda fazem ecos e provocam reflexos:

SEMPRE que sinto
    Minto no QUASE sentir
       SE pudesse assumir
          o que em mim existe
                                               Exit
             MAS...
                fulgaz condição de ir 
                  ATÉ um certo limite
                    do incerto que aflige
                       ATÉ onde permitem
                          MAS SE QUASE SEMPRE
                             QUASE ATÉ SEMPRE
                                MAS SE SEMPRE QUASE ATÉ
 
Então eu espero
            ATÉ
Você
              QUASE
querer
                MAS
eu
             SEMPRE
contigo
              SE... 

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